Não cobice a casa de outro homem. Não cobice a sua mulher, os seus escravos, o seu gado, os seus jumentos ou qualquer outra coisa que seja dele. (Êx 20.17)
Chegamos aos dois últimos mandamentos. Eles podem ser resumidos em duas palavras: não cobice. É impressionante a reviravolta na ordem dos mandamentos. Deus cuidou do nosso relacionamento com Ele mesmo, com nossos pais e superiores, de nossas vidas, nossos cônjuges, nossos bens e da honra do próximo. E agora vem nos orientar quanto á cobiça. Parece que estes mandamentos fogem dos outros cinco que tratam do nosso relacionamento com o próximo.
Do dicionário aprendemos que cobiça é o desejo veemente de alcançar riquezas ou bens materiais. Já um dicionário bíblico diz que a cobiça quer para si o que pertence ao próximo. Não é cobiça o menino querer chupar bala quando vê outro menino chupando bala, mas se exigir a bala do outro, então é cobiça. A cobiça revela características reprováveis, como descontentamento, inveja, egoísmo, desconfiança do amor de Deus, descrença da bondade divina, falta de amor ao próximo (McNair, A Bíblia Explicada, Ex 20.17).
É interessante observar a história da criação do ser humano e como o ser humano cometeu o primeiro pecado. Deus havia dado ao ser humano um belo lugar para viver em sua companhia e a possibilidade de viver livre. Para continuar nesta vida, não deveria comer do fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal, ou seja, não deveria cobiçar ter um conhecimento que era exclusivo de Deus. Quando Satanás usou a serpente para tentar Adão e Eva, fez com que eles cobiçassem aquilo que Deus havia dito para não cobiçarem. Na criação, o ser humano era livre. Só não devia cobiçar. Falhou no primeiro teste da fruta, no qual não deixou Deus ser Deus, mas atendeu às insinuações de Satanás, que disse que o ser humano seria como Deus conhecedor do bem e do mal. Deus disse isso porque sabe que, quando vocês comerem a fruta dessa árvore, os seus olhos se abrirão, e vocês serão como Deus, conhecendo o bem e o mal. (Gn 3.5).
A cobiça é isso. É querer ser mais do que aquilo que somos. Mas vamos devagar. Não é errado querer melhorar de vida. O errado é permitir que este meu anseio se torne uma obsessão e que, para alcançar meu intento, eu use quaisquer meios que estejam ao meu alcance, sejam eles bons ou maus, legais ou ilegais, morais ou imorais. Além disso, é errado também eu permitir que o meu desejo de ser igual ou mais do que alguém me domine, ao ponto de que eu não possa mais viver com dignidade e tranqüilidade.
Em 1 Rs 21 encontramos uma história que mostra perfeitamente o que a cobiça pode fazer na vida de uma pessoa. Ouçam o que diz o texto bíblico:
Acabe, rei de Samaria, tinha um palácio em Jezreel. Perto desse palácio havia uma plantação de uvas que pertencia a um homem chamado Nabote. Certo dia Acabe disse a Nabote:
– Dê-me a sua plantação de uvas. Ela fica perto do meu palácio, e eu quero aproveitar o terreno para fazer uma horta. Em troca, eu lhe darei uma plantação de uvas melhor do que a sua ou, se você preferir, eu pagarei um preço justo por ela.
– Esta plantação de uvas é uma herança dos meus antepassados! – respondeu Nabote. – Deus me livre de entregá-la ao senhor!
Acabe foi para casa aborrecido e com raiva por causa do que Nabote tinha dito. Ele se deitou na cama, virado para a parede, e não quis comer nada. Então a sua esposa Jezabel foi falar com ele e perguntou:
– Por que você está assim aborrecido? Por que não quer comer?
Ele respondeu:
– É por causa do que Nabote me falou. Eu lhe disse que queria comprar a sua plantação de uvas ou então, se ele preferisse, eu lhe daria outra em troca. Mas Nabote me disse que não me daria a sua plantação.
Acabe ficou tão desgostoso com a resposta que Nabote lhe deu que não conseguiu mais viver em paz. A cobiça lhe tirou a liberdade de viver e ele entrou em depressão. Tudo parecia sem sentido e Ele só ficava pensando na plantação de uvas de Nabote e no fato de que ele não podia tê-la para si.
Quando nós permitimos que a cobiça, a ambição tome conta de nosso ser, nós também não vivemos. Ficamos olhando para os outros, para aquilo que eles possuem, e não conseguimos enxergar o que nós temos, o que nós somos.
Mas a história da cobiça de Acabe pela plantação de uvas de Nabote não terminou aí. A cobiça sempre leva a outras coisas. Vejam o que aconteceu:
Então Jezabel disse a Acabe, o seu marido:
– Afinal de contas, você é o rei ou não é? Levante-se, anime-se e coma! Eu darei a você a plantação de uvas de Nabote, o homem de Jezreel!
Então ela escreveu algumas cartas em nome de Acabe e carimbou-as com o anel-sinete dele e as mandou para as autoridades e para os líderes de Jezreel. As cartas diziam o seguinte: "Mandem avisar que vai haver um dia de jejum, reúnam todo o povo e ponham Nabote no lugar de honra. Ponham sentados na frente dele dois homens de mau caráter para acusarem Nabote de ter amaldiçoado a Deus e ao rei. Depois levem Nabote para fora da cidade e o matem a pedradas."
As autoridades e os líderes de Jezreel fizeram o que Jezabel havia ordenado. Eles mandaram avisar que ia haver um dia de jejum, reuniram o povo e puseram Nabote no lugar de honra. Então, diante do povo, os dois homens de mau caráter acusaram Nabote de haver amaldiçoado a Deus e ao rei. E assim ele foi levado para fora da cidade e morto a pedradas. Depois mandaram dizer a Jezabel:
– Nabote foi morto a pedradas.
Logo que Jezabel recebeu o recado, disse a Acabe:
– Nabote morreu. Agora vá e tome posse da plantação de uvas que ele não quis vender a você.
Logo que soube que Nabote estava morto, Acabe foi até a plantação de uvas e tomou posse dela.
Mentiras, morte, roubo, entre outros. Se Acabe tinha um pouco de honra, sua esposa Jezabel pensava diferente. Para ela, ele podia usar todos os artifícios imagináveis para conseguir o que queria. Afinal, ele era ou não era o rei? Em outras palavras: você quer ou não quer ter essa plantação de uvas? Se quer, então faça tudo para consegui-la. E lá se foi ela preparar uma armadilha para dar ao seu marido aquilo que ele tanto queria.
A Bíblia tem ainda outros exemplos de casos de cobiça. Davi, por exemplo, para poder ficar com Bate Seba, a mulher de seu vizinho, comandante de seu exército e amigo Urias, não hesitou em manda-lo para a morte, ainda que tenha disfarçado seu homicídio. Esaú, cobiçando um prato de comida, vendeu seu direito de primogenitura, e Jacó, cobiçando o direito que era de Esaú, cobrou caro pelo prato de comida que o irmão queria.
A cobiça, a ambição desenfreada, seja pelo que for, sempre leva a outros pecados. Quando olhamos os anúncios oferecendo emprego nos jornais, vemos que os candidatos aos cargos de vendedores devem ter, entre outras qualidades, ambição. E os patrões pagam comissões aos seus vendedores. Com isso, induzem seus funcionários a usar todos os meios e artifícios para que o produto seja vendido. Há algum tempo assisti uma palestra sobre métodos de vendas e o palestrante disse: o bom vendedor vende uma caixa de fósforos com todos os palitos queimados e prova ao cliente que aquilo é o que ele mais precisa no momento. E o cliente paga o preço que o vendedor pedir por esta caixa de fósforos inúteis. O que se aprende daí é que para que alguém seja bom vendedor – e com isso cubra os anseios de sua própria cobiça e da cobiça do seu patrão – precisa ser mentiroso e enganador. Felizmente nem todos os vendedores são assim.
Poderíamos ficar muito tempo citando exemplos de como a cobiça atinge a cada um de nós. Mas isso não convém neste momento. Precisamos aprender algo que é mais importante que tudo.
Nós não temos necessidade de cobiçar a casa do nosso próximo, a sua propriedade ou seja lá o que for para ficarmos como únicos; poderosos na terra. Nós somos cristãos. E em Cristo tudo é nosso, como diz o apóstolo Paulo em 1 co 3.22. Também não precisamos possuir as coisas do próximo para sermos felizes. Salomão, inclusive, quando teve a oportunidade de pedir a Deus o que quisesse, não pediu riqueza, mas sabedoria. E Deus lhe deu as duas coisas.
Precisamos lembrar que não é o possuir que enriquece, mas a alegria de viver com aquilo que Deus nos deu no lugar em que nos colocou. Nós concluímos o Pai Nosso dizendo teu é o Reino. Se o Reino é de Deus, Ele pode nos dar satisfação em nossa vida sem a cobiça de possuirmos aquilo que Deus decidiu dar a outra pessoa, seja a sua casa, a sua família ou qualquer outra coisa.
O apóstolo Pedro nos aconselha e lembra: abandonem tudo o que é mau, toda mentira, fingimento, inveja e críticas injustas. Sejam como criancinhas recém-nascidas, desejando sempre o puro leite espiritual, para que, bebendo dele, vocês possam crescer e ser salvos. Pois, como dizem as Escrituras Sagradas: "Vocês já descobriram por vocês mesmos que o Senhor é bom."Cheguem perto dele, a pedra viva que os seres humanos rejeitaram como inútil, mas que Deus escolheu como de grande valor... Vocês são a raça escolhida, os sacerdotes do Rei, a nação completamente dedicada a Deus, o povo que pertence a ele. Vocês foram escolhidos para anunciar os atos poderosos de Deus, que os chamou da escuridão para a sua maravilhosa luz. Antes, vocês não eram o povo de Deus, mas agora são o seu povo; antes, não conheciam a misericórdia de Deus, mas agora já receberam a sua misericórdia. (1 Pe 2.1-4, 9-10).
Se somos a raça escolhida, o povo que pertence a Deus, então temos tudo o que é de Deus e podemos viver contentes e felizes com o que somos e temos. Vamos, pois, viver esta vida alegre e satisfeita na certeza de que temos um tesouro preparado no céu, tesouro que não pode ser corrido pela ferrugem, nem pela traça, nem roubado por ladrões. Nós somos herdeiros de Deus. Amém.
(Rev. Éder Carlos Wehrholdt - Campo Largo/PR)
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